quarta-feira, 5 de abril de 2017

De malas prontas com o jornalismo

Beatriz Costa com Ingrid Medina, Marina Bastos e edição de Arthur Araújo


Alunos puderam dialogar com profissionais com experiência no mercado internacional 

“A gente fica tão focado em estar aqui [na Bahia], que não consegue perceber as oportunidades lá fora. As possibilidades de fazer comunicação estão muito mais amplas”, comentou a jornalista e produtora de eventos Brenda Ramos, durante a 5ª edição do Ciclos de jornalismo, que aconteceu na última quinta-feira (30), no auditório da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia (Facom/UFBa). Além dos estudantes da Facom, estiveram presentes alunos de faculdades particulares, como a Unifacs, Faculdade de Tecnologia e Ciências (FTC) e Dois de Julho.

Promovido pelo Núcleo de Estudos em Jornalismo (NJor), o tema do encontro foi “Fazendo Jornalismo Fora da Bahia”. Para debater o assunto, três jornalistas com experiências profissionais em Madri, Angola e São Paulo apresentaram as diferenças dos mercados e das rotinas de trabalho. Foram eles: Brenda Ramos, que atuou como assessora da presidência em Angola, Nelson Barros Neto, atual gerente de comunicação do Esporte Clube Bahia, que trabalhou na capital paulista como redator do Portal R7 e na editoria de esporte da Folha de S. Paulo, além de Juan Torres, diretor de inovação do Correio*, que vivenciou a rotina na redação dos jornal Marca (Espanha) e fez intercâmbio no The Texas Tribune (EUA).

Dois debatedores foram convidados para o evento: a jornalista e professora Malu Fontes e o editor do Aratu Online e mestrando do Programa de Pós-graduação em Comunicação e Cultura (PósCOM), André Uzeda, que foi correspondente da Folha de S.Paulo. À frente da mediação estava o jornalista Eder Luis Santana, doutorando do PósCOM e membro do NJor.

Experiências na bagagem 

Durante os três anos como executiva de comunicação em Angola, Brenda Ramos afirma ter passado por diversos desafios. Machismo e preconceito eram problemas frequentes na sua rotina. Ainda assim, a produtora de eventos acredita que a experiência internacional valeu a pena, como explicou em entrevista ao FacomNews. “Indico para todo mundo porque é um crescimento profissional e pessoal incrível. Você tem que lidar com uma cultura diferente, trabalhar com seu texto, transformar para outra realidade. Todo mundo tem que estar aberto a isso de alguma forma”, defendeu.

Para Nelson Barros Neto, trabalhar em outros estados é um processo de recomeço, já que você precisa construir um nome do zero, além de ser um processo que exige determinação. “Para mim foi tudo muito natural, as coisas foram acontecendo, mas é preciso trabalhar duro. O mais importante é se empenhar. Não tem como achar que as coisas vão acontecer do nada. Você tem que dar o seu melhor”, destacou, também em entrevista.


Presença de alunos de faculdades como Unifacs, FTC e Dois de Julho marcou o evento

“É importante sair para beber de outras fontes, mas também para desmistificar essa ideia de inferioridade que o brasileiro costuma ter”, defendeu o jornalista Juan Torres. “A saída para outros estados ou para o exterior é importante para ver o que acontece lá fora, voltar e perceber que fazemos um bom trabalho aqui, equivalente ao trabalho de lá. Essas oportunidades, além de darem aprendizados, são uma boa injeção de autoestima que permite ver como produzimos coisas legais”, avaliou. O jornalista reiterou, em conversa com a equipe do FacomNews, que não há ampla diferença no capital humano que trabalha nas redações do Brasil e do exterior. O diferencial está na estrutura de trabalho oferecida.

O acesso às oportunidades internacionais está disponível para todos. De acordo com Juan Torres, a melhor parte das suas experiências relatadas é o fato de não terem sido custeadas com bolsas de incentivo. “Nunca gastei um centavo. Pelo contrário, acabei voltando com dinheiro. Existem muitos programas disponíveis fora do Brasil que dão bolsas e que mantêm a gente por um tempo. É importante acompanhar esses movimentos, esses programas e seguir essas oportunidades”, contou.

Para a professora Malu Fontes, os mercados estão todos envolvidos em um mesmo momento de crise. "Temos uma crise do jornalismo mundial, não apenas no baiano. O que chamo de crise é como se ajustar a esse novo mercado pós-industrial com a decadência do impresso. Mas levando em conta que estamos dentro disso, no Nordeste temos os problemas que todos têm, claro que dentro das suas especificidades regionais. Todos estão passando por crises semelhantes", defendeu em entrevista.

Diferenças de mercado

As diferenças sentidas pelos profissionais nos diversos mercados explorados também foi alvo de interesse dos estudantes presentes no evento. Para Brenda Ramos, por exemplo, o que chamou mais atenção foi a questão cultural. “Senti a diferença de trato com o outro. Em Angola eles são muito formais e o brasileiro é mais despojado. Quando você marca às 17 horas, será às 17 horas em ponto, e não às 17h15, como é aqui. Enfim, são essas pequenas formalidades, além da forma mais séria de lidar com o trabalho”, contou.

Para Juan Torres, que passou por redações em Madri e no Texas, as diferenças podem ser apontadas tanto em questões comportamentais, como a animação e irreverência das redações, quanto de tradição jornalística. “Seguimos um jornalismo da escola americana, muito mais objetivo, com mais pirâmide invertida, estrutura mais engessada, um jornalismo muito declaratório. Já o jornalismo europeu trabalha mais com a especulação, com análise e com texto mais livre. Essa é uma diferença grande. Outra diferença é quanto ao posicionamento político. Lá os jornais têm uma liberdade”, explicou.

André Uzêda, que edita o Aratu Online e atuou como correspondente da Folha de S. Paulo, destacou em entrevista que um dos pontos que diferenciam o jornalismo de envergadura nacional para o local é o incentivo à reportagem. “Eu estava no Ceará e acontecia uma coisa grave no Piauí no mesmo dia. Eles me mandavam cobrir. Uma coisa que me incomoda em Salvador é a falta desse incentivo. Acontece uma coisa, por exemplo, em Paripe e, às vezes, você manda o repórter cobrir por telefone”, comparou, após lembrar que essa é uma questão de falta de estrutura disponível e de oportunidade. "O jornalismo é o mesmo. Aprendendo a fazer não tem mistério, é jornalismo em qualquer lugar”, finalizou.

O jornalista Eder Luis Santana, que participou da organização do evento, definiu o encontro como uma iniciativa de diálogo entre a academia e o mercado. "Eventos como esse são a prova de que existe esse movimento de aproximação. É você pegar profissionais, pessoas que estão na labuta diária da comunicação, para que os estudantes, que estão muito mais ligados ao meio acadêmico, possam estabelecer uma relação de diálogo", completou.

Diversas instituições foram citadas durante a mesa redonda, desde fundações a organizações de classe. Confira:

ABRAJI
ONA
INJET
ICFJ
Fundacíon Carolina