quinta-feira, 6 de outubro de 2011

"Existe uma tensão no campo e uma série de constrangimentos entre os próprios críticos" | Rachel Lima

Simone Melo
Foto: Daniele Rodrigues (Labfoto/Facom)

Queria começar perguntando a sua opinião sobre como formar um crítico literário. Ele deve ser um jornalista, deve ser um especialista em Letras?
Não há nenhum problema em formar um crítico literário no jornalismo. O que é necessário é que ele se interesse realmente pelo campo, tenha um conhecimento do campo literário, da história da literatura, que ele consiga fazer uma avaliação da obra, não é que seja objetiva, mas que tenha a ver com essa tradição do campo. Que consiga ter a sensibilidade de perceber a importância da novidade, daquilo que difere de tudo aquilo que foi feito antes, e que tenha essa condição de perceber como o espaço da crítica literária se organiza e que consiga se colocar e se posicionar bem nesse lugar.

Mas essa formação seria possível já durante a graduação?
É muito difícil. Na verdade, é difícil formar um crítico, porque é difícil chegar a essa posição. Imagine ter toda uma leitura dessa tradição, é complicado. Mas é claro que as pessoas precisam começar. No caso da crítica de cinema, o Glauber Rocha com 15 anos já fazia crítica de cinema. Precisamos perceber que há exceções. E existem críticos que são da área de Letras que não considero que sejam bons, isso varia muito. O crítico precisa se legitimar, possuir uma diferença, tem que ter coragem, não é fácil ser crítico. É uma atividade bastante arriscada, envolve subjetividade, conhecimento, leitura de mundo da contemporaneidade.

Que tipos de pressões sofrem os críticos literários na construção dos seus trabalhos voltados para o meio acadêmico?
Teoricamente, a academia é mais livre, ela estuda o que quer..

Por que teoricamente?
Porque ninguém é livre totalmente. Todo mundo tem uma visão que não é individual, mas construída dentro de um espaço social. Então, segue-se determinados alinhamentos também. Eu acho que não existe liberdade total para ninguém, nem para o círculo acadêmico. Se o professor fica muito distante de certas linhagens, ele acaba correndo um certo risco.Você tem que pensar o campo como um jogo conflituoso, há pessoas que preferem não trabalhar literatura contemporânea porque é menos arriscado, mesmo na academia. Não tem ninguém que não sofra pressões, você está dentro de um sistema. Teoricamente, pode-se estudar o que bem entender, mas haverão constrangimentos, que também são de ordem econômica, que podem te levar a perder espaço, se você ficar muito distante daquilo que é hegemônico. Mas, é claro que não há um consenso dentro da academia e isso faz com que haja um série de linhas teóricas em confronto.

Essas linhas de confronto não alimentam o debate?
Na verdade, há alguns debates no campo da crítica jornalística. Mas eu acho que os debates são poucos, deveria haver mais. Fica todo mundo muito na defesa porque sabe que é arriscado tomar posição. Existe uma tensão no campo e uma série de constrangimentos entre os próprios críticos.